sábado, 9 de fevereiro de 2008

Sobre os perigos da Perfeição

Há um conjunto de imagens propagandísticas do Estado Novo que deveriam merecer a nossa reflexão.
Olhando o Seixal no espelho do seu Boletim Municipal ou na propaganda da estrutura local do PCP quase concluiríamos que nos encontramos no mesmo mundo colorido, harmónico, organizado, moderno e perfeito que aqui se propagandeava.




As semelhanças não se esgotam aqui. A propaganda ao Estado Novo, contém ainda outra similitude com o Boletim Municipal (propaganda de CMSeixal)/PCP), é o público a que se dirige, um público pouco letrado e para o qual o progresso, a modernidade, a segurança e a harmonia são os valores supremos.
A escolha dos monumentos a restaurar (em alguns casos a recriar) e das iniciativas culturais não era de modo nenhum inocente, era feita de acordo com os critérios do Estado Novo. Também no Seixal parece haver um conjunto de critérios que definem se um dado património é ou não dispensável (ver aqui).
O comunistas acreditam na revolução como forma de transformar a sociedade mas, logo que eles próprios tomam o poder, a revolução desaparece para dar lugar à “harmonia”.Veja-se a curiosa insistência na imagem de harmonia” (quase diria de “pasmo”) que nos é veiculada continuamente pela propaganda camarária e pelo próprio PCP quando se refere ao concelho do Seixal: a perfeição. Ora, esta imagem é recorrente e pretende a perpetuação do poder. As contradições presentes no tecido social anulam-se para dar lugar à perfeição: os munícipes estão satisfeitos, há um dinamismo que se pode ver na dúzia de fotos em que o trabalho autárquico nas suas diversas facetas é explorado até ao limite pela imagem, existem festas e comemorações com fogos de artifício e música. Tudo está bem no melhor dos concelhos. Ora, como se pode mudar o que já é perfeito? O que é “perfeito” não carece de mudança… nestas circunstâncias, o papel das oposições torna-se difícil. Opor-se à perfeição, à harmonia, ao progresso, à segurança? Esta vontade de mostrar perfeição, esta "mediocridade dourada", é também característica da propaganda do Estado Novo desejoso, também ele, de se perpetuar no Poder e de eliminar as oposições.

A utilização da imagem para falsear a realidade não é uma realidade nova. As tecnologias de informação que massificam essa ocultação da realidade e permitem manipulá-la cada vez melhor são o desafio que cada vez mais se coloca aos cidadãos que pretendem continuar a pensar pela sua própria cabeça.


4 comentários:

Filipe de Arede Nunes disse...

Que posso dizer que acrescente algo de positivo a este post?
Revejo-me inteiramente nas suas palavras, e a analogia entre o Estado Novo e a realidade - ou irrealidade - comunista no Seixal está muito bem encontrada. No fundo, os extremos tocam-se sempre. Tanto o regime do Estado Novo como o comunismo se encontram em extremos. Ambos são, pela sua natureza, regimes profundamente autoritários. A prova existe e está documentada, em dezenas de Estados espalhados por todos os lugares do mundo.
Mais um grande texto.
Cumprimentos,
Filipe de Arede Nunes

David R. Oliveira disse...

Curioso! acabei agora mesmo de escrever sobre os primos, destes, que se dizem desavindos. Gostei! subscrevia sem qualquer rebuço. Cruzemos o seu texto com o meu no que pode ser cruzado e salvaguardas as diferenças de estilo.
David Oliveira

Bluegrowth disse...

A realidade é obvia, clara e objectiva mas igualmente triste e nefasta: aprenderam com aqueles a quem resistiram... hoje, somos - segundo eles - um concelho onde se prepetuam os icones, espaços e sobretudo uma cultura da resistência comunista deixando lentamente apagar os laços destas gentes e destes espaços com a realidade de outros tempos.

Somos assim - e segundo eles - um concelho de Abril, no entanto, na sofrega ganância têm-se esquecido de que há mais 11 meses no ano.

Parabéns HKT, mais uma vez, muito bem escrito...

Anónimo disse...

Este orgão de propaganda da Câmara e os seus editores esquecem-se que o mesmo é pago pelos impostos da edilidade. Para além de "fechar" os olhos a muita realidade do Concelho, ainda está colmatado com "negócios obscuros" de favores a deteminada Tipografia. Gostava que o Presidente da Câmara (que geralmente nega conhecer os jogos de interesses dentro da sua propria Câmara, através de comunicados) fosse averiguar os motivos de mudança de uma Tipografia do Concelho para outra de fora. Terá sido por razões economicas ??
Olhe que não Snr. Presidente, olhe que não ....