segunda-feira, 11 de maio de 2009

O Bairro do desespero


Dois conselhos me deram quando, em 1995, trabalhei no Bairro da Bela Vista: deveria evitar os espaços abertos circulando sempre que possível rente aos prédios para evitar ser alvo do lixo que alguns moradores atiram, sem cerimónias, pela janela fora; e, até ser reconhecida deveria fazer-me acompanhar nas minhas deslocações por alguém do bairro ...
O Bairro da Bela Vista é um excelente exemplo do que não deveriam ser os "bairros sociais". Infelizmente, um pouco por todo o lado continuamos a repetir uma experiência que sabemos votada ao fracasso, guetizando populações, mantendo-as em contextos sociais deprimidos e abandonando-as a grupos organizados que as sujeitam a uma violência continuada. Deixámos que o crime tomasse conta das ruas e, no caso do Bairro da Bela Vista, das partes comuns dos prédios, dos pátios ...
A concepção deste Bairro (como de tantos outros) obedeceu à lógica da prateleira: os prédios foram concebidos para esconder os problemas sociais mais, do que para resolvê-los. Desde o início que o empilhamento de pessoas de origens e culturas diversas é um problema real. Desde início que os grupos étnicos obrigados a partilhar os mesmos espaços apesar das rivalidades ancestrais levaram à formação de grupos como estratégia de dupla protecção contra "os do Bairro" e contra todos os outros. Desde início todas as tentativas de integração desta população falharam dado que a única coisa que os ligava era serem provenientes de meios deprimidos.
Sem projecto de vida, sem educação, sem formação social e perseguidos pelo estigma do Bairro (que dificulta o acesso ao emprego, aos empréstimos bancários ...) resta-lhes vegetar na subsídio-dependência ou (para os mais desejosos de qualquer tipo de reconhecimento), na criminalidade. A maior parte da população sente-se refém do Bairro, dos grupos organizados que controlam cada esquina, cada escadaria e sem alternativa perante uma sociedade que sentem como hostil (a língua e a escrita que muitos não dominam é, apenas, um dos factores de desconfiança relativamente à sociedade).

O mais grave, não são os erros cometidos por todos, os que de uma forma ou de outra, contribuíram para que a Bela Vista fosse a realidade que conhecemos. O mais grave, é que depois de conhecidos e analisados os resultados, continuámos a criar bairros que apenas irão esconder os problemas sociais aumentando sempre o fosso entre a sociedade e "os do Bairro", num ciclo de marginalização contínua, em lugar de encontrar alternativas de integração.
_____

1 comentário:

Anónimo disse...

Olá, artigo mais ou menos, mas um erro de análise grande. É que este bairro nunca foi concebido para bairro social... foi concebido para quadros da Setenave.