sábado, 14 de junho de 2008

Seixal kitsch


“…onde um partido único detém todo o poder, não há escapatória possível ao império do kitsch totalitário.

Se digo totalitário, é porque tudo quanto pode fazer perigar o kitsch é banido da vida: não só toda e qualquer manifestação de individualismo (a mais pequena discordância é um escarro cuspido em plena cara da risonha fraternidade), toda e qualquer manifestação de cepticismo (quem começa por pôr um pequeno detalhe em dúvida, acaba por pôr em dúvida a própria vida), toda e qualquer manifestação de ironia (porque no reino do kitsch é tudo para levar a sério) […] constitui uma ameaça[…].”

Milan Kundera, A Insustentável Leveza do Ser

A imagem que o Boletim Municipal nos dá do concelho em que vivemos é a de um lugar onde a contradição fundamental está entre o bom e o melhor. Todos os problemas existentes ou pendentes, advêm do exterior nomeadamente, do “poder central”. Nesta estética, não há lugar para a contradição. Quem poderia opor-se a um poder que já está entre o bom e o melhor e que se encaminha, presumivelmente, para o óptimo??

Só espíritos delirantes, loucos ou malévolos. Por esta razão, nos países do socialismo real estas" almas perdidas" são enviadas para o hospital psiquiátrico ou, para algum gulag. Por esta razão, neste concelho (onde existe até uma “freguesia florida”, existirá algo de mais kitsch?) os que questionam as opções da edilidade ou, os que a censuram são tolerados com dificuldade. Vários episódios recentes comprovam precisamente esta dificuldade em conviver com o contraditório. Os comentários deixados no a-sul pelos acérrimos defensores dos padrões do kitsch local, os acontecimentos lamentáveis da assembleia municipal e da reunião de câmara… e agora isto: aquando da visita do executivo camarário à Feira [da Terra], este viu foi com desagrado o abaixo-assinado exposto [para que não se licencie um estabelecimento para a engorda artificial de peixes que uma empresa privada pretende instalar no Sapal de Corroios, e para que seja preservada esta zona húmida que é a mais bem conservada de todo o estuário do Tejo, a sul de Alcochete, abrangida pela legislação da Reserva Ecológica Nacional], razão pela qual a organização daquele evento retirou abusivamente aquele documento do stand do Grupo Flamingo.”

…mas não haverá mesmo escapatória ao totalitarismo deste kitsch?

Outros posts sobre a estética totalitária no Seixal: aqui, aqui e aqui.

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