domingo, 8 de março de 2009

Os desastres de Manuela

Quando era criança era uma leitora infatigável houve porém, um livro que nunca li, Os desastres de Sofia, da condessa de Ségur. Não o li porque não foi possível comprá-lo (teria outras prioridades) e, depois, não o li porque já tinha passado o tempo. De qualquer forma, sabendo que a pequena e indomável Sofia é muito diferente da circunspecta Manuela Ferreira Leite não resisto a uma comparação:

A primeira constatação vai para o facto de MFL ser até à data a única líder de um partido representado na A.R.. Tivemos rainhas, e até uma primeira-ministra mas, líderes partidárias (de partidos do sistema), ainda não tínhamos tido. Logo aqui, uma diferença. Embora não aprecie muito a ideia da "política no feminino" reconheço, por experiência própria, que há diferenças e a primeira delas é a relativização da vida política. A política pode fazer parte da vida das mulheres mas, não é a sua principal razão de existência. A vida política, tal como tem sido entendida obriga a viagens frequentes, a deslocações insanas, a sorrisos e a apertos de mão, a briefings e reuniões que na sua maior parte são inúteis. A política partidária, tal como tem sido entendida reduz-se a uma incessante "contagem de espingardas" e à busca de tapar o "deserto de ideias" com o alarido das sucessivas intervenções e declarações; a embrulhar as obras (feitas e por fazer) em outdoors, pastéis de bacalhau, encenações e, recentemente, power-points que anulam o sentido crítico dos mais insuspeitos, tal como, a magnitude dos palácios e a riqueza dos trajes deslumbrou, em tempos, súbditos de D. João V.

Ora, MFL é, pela sua sobriedade, uma candidata contra o sistema. Mulher, senhora de uma reputação de competência, honestidade e intransigência, com um curriculum político simultaneamente invejável e incómodo, MFL tem procurado fugir da política espectáculo e, curiosamente, é por isso que é mais criticada. Ela não tem procurado avidamente os microfones e as câmaras, quis aparecer de forma sóbria sem extravagâncias. Ora, num país onde os políticos são continuamente destratados, onde as suspeitas de corrupção, de incompetência, de esbanjamento dos dinheiros públicos são constantes, MFL continua a ser criticada por, em muitos aspectos, ser diferente dos outros políticos. Censuram-lhe, a ela, a falta daquilo que criticam aos outros. Afinal, o que queremos nós? Não estamos já todos fartos de "pão e circo"? Queremos continuar a ser continuamente seduzidos por políticos com "boa imagem" e "dom de palavra" mas, cuja obra, a índole e, a competência estão sob suspeita?

Para já MFL, de mansinho, vai desmontando a "rosa", evitando alaridos, procurando não esticar demasiado a corda pois, apesar de tudo, o PSD é um partido do sistema e não fica bem deixar-se levar por entusiasmos de ocasião contudo, haverá um momento em que terá de se apresentar como alternativa. E nessa altura terá de optar entre dizer aos portugueses aquilo que eles querem ouvir ou, arriscar-se a perder eleições dizendo a verdade sem subterfúgios.

Tanto quanto sei a mãe de Sofia conseguiu transformá-la numa jovem capaz de se articular com as convenções da sua época de forma a que a seu tempo se tornasse numa jovem casadoira. Conseguirão o "aparelho" partidário, e os comentadores transformar MFL numa líder capaz de seduzir o eleitorado? E se o fizerem, qual o preço a pagar?

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